A Cativa - Luiz da Gama
- iamfromsouthamerica
- 7 de ago. de 2023
- 1 min de leitura
Atualizado: 25 de nov. de 2023
Uma graça viva Nos olhos lhe mora, Para ser senhora De quem é cativa. (Camões) |
Como era linda, meu Deus! Não tinha da neve a cor, Mas no moreno semblante Brilhavam raios de amor. Ledo o rosto, o mais formoso, De trigueira coralina, De Anjo à boca, os lábios breves Cor de pálida cravina. Em carmim rubro engastados Tinha os dentes cristalinos; Doce a voz, qual nunca ouvira, Dúlios bardos matutinos. Seus ingênuos pensamentos São de amor juras constantes; Entre a nuvem das pestanas Tinha dois astros brilhantes. As madeixas crespas, negras, Sobre o seio lhe pendiam, Onde os castos pomos de ouro Amorosos se escondiam, Tinha o colo acetinado – Era o corpo uma pintura – E no peito palpitante Um sacrário de ternura. Límpida alma, flor singela Pelas brisas embaladas, Ao dormir d’alvas estrelas, As nascer da madrugada. Quis beijar-lhe as mãos divinas, Afastou-mas – não consente; A seus pés de rojo pus-me – Tanto pode o amor ardente! Não te afastes, lhe suplico, És do meu peito rainha; Não te afastes, neste peito Tens um trono, mulatinha!... Vi-lhe as pálpebras tremerem, Como treme a flor louçã, Embalando as níveas gotas Dos orvalhos da manhã. Qual na rama enlanguecida Pudibunda sensitiva, Suspirando ela murmura; Ai, senhor, eu sou cativa!... Deu-me as costas, foi-se embora
Qual da tarde do arrebol
Foge a sombra de uma nuvem
Ao cair da luz do sol.
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Luis da Gama (1830-1882) foi um importante intelectual negro brasileiro do século XIX . Advogado e escritor, ele é considerado o Patrono da Abolição da Escravatura no Brasil e é o maior abolicionista do Brasil. Nascido de mãe negra livre e pai branco, foi contudo feito escravo aos 10 anos, e permaneceu analfabeto até os 17 anos de idade. Doze anos após aprender a ler e escrever escreve sua primeira obra. Sua escrita é na primeira pessoa, sem esconder a própria origem e sem deixar de demostrar sua negritude.
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